segunda-feira, 16 de maio de 2011

Desde adolescente, escuto minha mãe e outras pessoas cujos conselhos considero importantes dizerem que, quando algo nos aflige muito e não sabemos ao certo o que fazer ou pensar, é sempre bom pegarmos um livro, religioso ou não, e perguntarmos ao universo aquilo sobre o que gostaríamos de ter uma resposta.
Nem sempre eu faço isso... mas hoje eu estava lendo "Mulheres que correm com os lobos", da psicanalista Clarissa Pinkola Estés, e resolvi testar... Desconsiderando os aspectos pessoais do caso, vou reproduzir o trecho aqui, porque é bem interessante.

A perseguição e a tentativa de se ocultar

"A natureza da morte tem o estranho hábito de surgir nos casos de amor exatamente no instante em que temos a sensação de ter conquistado alguém, exatamente quando sentimos que fisgamos "um peixe grande". É então que a natureza da vida-morte-vida vem à tona e deixa todo mundo apavorado. É nesse estágio que se desenvolve mais o pensamento tortuoso a respeito dos motivos pelos quais o amor não pode, não deve e não vai dar "certo" para qualquer das partes interessadas. É nesse estágio que as pessoas se enfurnam na toca. Trata-se de um esforço para se tornar invisível. Invisível ao parceiro? Não. Invisível à Mulher-esqueleto. É esse o objetivo real de toda essa correria à procura de um lugar para se esconder. No entanto, como estamos vendo, não há nenhum lugar onde possamos nos esconder.
A psique racional vai pescar à procura de algo que seja profundo e não só fisga o que procurava mas fica tão assustada que mal pode tolerar. Os amantes têm uma sensação de que algo os persegue. Às vezes pensam que é o outro quem empreende a perseguição. Na realidade, é a Mulher-esqueleto. No início, quando estamos aprendendo a amar de verdade, não compreendemos bem muitas coisas. Achamos que ela nos persegue, quando de fato nossa intenção de nos relacionarmos com outro ser humano de um modo especial é o que fisga a Mulher-esqueleto de tal forma que ela não consegue fugir de nós. Onde quer que o amor esteja nascendo, a força da vida-morte-vida sempre virá à tona. Sempre.
Portanto, aqui estão o pescador e a Mulher-esqueleto, completamente enredados um no outro. Enquanto a Mulher-esqueleto segue aos trancos o pescador apavorado, ela começa uma participação primitiva na vida: sente fome e come peixe seco. Mais tarde, quando ela se aproxima ainda mais da vida, ela sacia sua sede com a lágrima do pescador.
Vemos esse estranho fenômeno em todos os casos de amor: quanto mais ele corre, maior velocidade ela alcança. Quando um parceiro ou o outro tenta fugir do relacionamento, esse relacionamento paradoxalmente recebe mais vida. Quanto mais vida é gerada, mais assustado fica o pescador. E quanto mais ele corre, mais vida se cria. Esse fenômeno é uma das principais tragicomédias da vida.
(...)
Esses vislumbres no interior da Mulher-esqueleto fazem com que os aprendizes do amor peguem suas varas de pescar e saiam por aí à toda, esforçando-se para se distanciar dela o máximo possível. A Mulher-esqueleto é imensa e misteriosa; sua numinosidade é deslumbrante. Em termos psíquicos, ela se estende de um horizonte ao outro e desde o céu até o inferno. Ela é grande demais para se abraçar. Mesmo assim, não é de supreender que as pessoas corram para abraçá-la. O que se teme pode fortalecer, pode curar.
A fase de correr e de se esconder é o período no qual os amantes tentam racionalizar seu medo dos ciclos de amor da vida-morte-vida. Eles dizem "Posso me dar melhor com outra pessoa", "Não quero renunciar a meu ....", "Não quero mudar minha vida", "Não quero encarar minhas feridas, nem as de ninguém mais", "Ainda não estou pronto" ou ainda "Não quero ser transformado sem primeiro saber nos ínfimos detalhes como vou ficar/me sentir depois."
É uma fase em que os pensamentos ficam todos confusos, quando se quer procurar um abrigo a todo custo e quando o coração bate, não tanto por amor ou por se sentir amado, quanto por um terror humilhante. Ser encurralado pela Morte! Ai! O horror de enfrentar a força da vida-morte-vida pessoalmente! Ai, ai!
Há quem cometa o erro de pensar que está fugindo do relacionamento com o parceiro. Não está, não. Não está fugindo do amor ou das pressões do relacionamento. Está tentando correr mais rápido do que a misteriosa força da vida-morte-vida. A psicologia diagnostica essa situação como "medo da intimidade, medo do envolvimento".  No entanto, esses são apenas sintomas. A questão mais profunda é de descrença e desconfiança. Aqueles que fogem sempre temem viver de fato de acordo com os ciclos da natureza selvagem.
Pois nesse ponto A Morte persegue o homem pelas águas, cruzando a fronteira entre o inconsciente e a terra firme da mente consciente. A psique consciente percebe o que fisgou e tenta desesperadamente correr mais do que a presa. Constantemente agimos assim nas nossas vidas. Algo de apavorante mostra sua cara. Nós não estamos prestando atenção e continuamos a puxar a linha, imaginando se tratar de uma boa pesca. É um achado, mas não do tipo que estávamos imaginando. É um tesouro que infelizmente aprendemos a temer. Por isso, tentamos fugir ou jogá-lo de volta; tentamos embelezá-lo ou torná-lo o que não é. Isso, porém, nunca funciona. No final, todos temos de beijar a megera.
O mesmo processo ocorre no amor. Queremos só a beleza, mas acabamos tendo de encarar a "perversa". Empurramos a Mulher-esqueleto para longe de nós, mas ela insiste. Nós corremos. Ela acompanha. Ela é a grande mestra que sempre dissemos que queríamos. "Não, não essa mestra!" berramos. Queremos uma outra. Que pena. Essa é a mestra que cabe a todos.
Há um ditado que diz que, quando o aluno está pronto, o professor aparece. Isso quer dizer que o professor chega quando a alma, não o ego, está pronta. O mestre vem quando a alma chama - e graças a Deus que isso aconteça pois o ego nunca está perfeitamente pronto. Se dependesse apenas do preparo do ego o fato de o mestre ser atraído até nós, permaneceríamos essencialmente sem mestres pela vida afora. Somos abençoados, já que a alma continua transmitindo seu desejo ignorando as opiniões inconstantes do ego.
Quando as coisas ficam enredadas e assustadoras nos relacionamentos amorosos, as pessoas receiam que o fim esteja próximo, mas isso não é verdade. Como se trata de uma questão arquetípica e como a Mulher-esqueleto realiza o trabalho do Destino, espera-se que o herói saia correndo pelo horizonte afora, espera-se que A Morte o acompanhe de perto, espera-se que o aprendiz de amante se enfie na sua choupana, ofegante e arquejante, com a esperança de estar são e salvo. E espera-se que a Mulher-esqueleto consiga também entrar nesse abrigo seguro. Espera-se que ele a desemaranhe e assim por diante.
Nos namoros modernos a ideia de "dar um tempo" é semelhante ao pequeno iglu do pescador, lugar onde ele se sente em segurança. Às vezes, esse medo de enfrentar a natureza da morte é desvirtuado, transformando-se numa atitude de "fuga da raia", na tentativa de manter apenas os aspectos agradáveis do relacionamento, deixando de lado o vínculo com a Mulher-esqueleto. Isso nunca funciona.
Essa atitude provoca extrema ansiedade no parceiro que não está "dando um tempo", pois ele próprio está disposto a se encontrar com a Mulher-esqueleto. Ele se preparou, se fortaleceu e está tentando manter seus temores sob controle. E agora, no exato instante em que está pronto para decifrar o mistério, no momento em que um ou o outro está prestes a batucar no coração e conjurar a uma vida juntos, um dos parceiros grita "ainda não, ainda não" ou "não, nunca, nunca".
Há uma enorme diferença entre a necessidade de solidão e renovação e o desejo de "dar um tempo" para evitar a inevitável ligação com a Mulher-esqueleto. No entanto, a ligação, no seu sentido de aceitação da natureza da vida-morte-vida e de permuta com ela, é o passo seguinte na direção de um fortalecimento da nossa capacidade para amar. Aqueles que entrem num relacionamento com ela conquistarão um duradouro talento para o amor. Aqueles que se recusarem não conquistarão nada. Não há como evitar isso.
Todos os "ainda não estou pronto", todos os "preciso de tempo" são compreensíveis por um curto período. A verdade é que não existe sensação de se estar "completamente pronto" ou de ser aquela a "hora certa". Como acontece em qualquer mergulho no inconsciente, chega uma hora em que simplesmente torcemos que dê certo, apertamos o nariz e saltamos no abismo. Se não fosse assim, não teríamos precisado criar as palavras herói, heroína ou coragem.
É preciso realizar o trabalho do aprendizado da natureza da vida-morte-vida. Rejeitda, a Mulher-esqueleto afunda para debaixo d'água, mas ela surgirá novamente e sairá no nosso encalço insistente. É essa a sua função. A nossa função é a de aprender. Se quisermos amar, não há como evitar esse aprendizado. O trabalho de abraçá-la é uma tarefa. Sem uma tarefa desafiadora, não pode haver transformação. Sem uma tarefa, não há uma satisfação verdadeira. Amar os prazeres é fácil. Já amar de verdade exige um herói que consiga controlar seu próprio medo.
Admite-se que muitas pessoas mesmo alcancem esse estágio de "fugir e se esconder". Algumas infelizmente voltam sempre a ele. A entrada na toca está marcada com sulcos desesperados. No entanto, quem quer amar imita o pescador. Ele se esforça para acender o fogo e encarar a natureza da vida-morte-vida. Ele contempla o que teme e, paradoxalmente, reage com convicção e assombro."


                                                               

quinta-feira, 5 de maio de 2011

O assassinato de Osama e os absurdos por detrás disso...

04.05.11 - Mundo





Assassinato de Estado esvazia ideia de justiça internacional



Marcelo Semer

Juiz de Direito em São Paulo. Foi presidente da Associação Juízes para a Democracia. Coordenador de "Direitos Humanos: essência do Direito do Trabalho" (LTr)

Adital



Osama Bin Laden era um bárbaro terrorista.

Mesmo depois de sua morte, é impossível ter compaixão ou piedade por quem, conscientemente, assumiu a responsabilidade pelo homicídio em massa de milhares de inocentes civis.

Mas nada disso oculta a realidade de domingo: seu assassinato é um ato de vingança, não de justiça.

Em 1945, com a rendição de alemães e japoneses, os aliados discutiam o que fazer com prisioneiros nazistas. Muitos pretendiam simplesmente liquidá-los, falando-se de fuzilamentos em massa. Os norte-americanos impuseram a força de sua razão, para realizar julgamentos históricos em Nuremberg.

Pode-se dizer que Nuremberg foi um tribunal de exceção, criado após os crimes terem sido cometidos. Que se constituiu em uma justiça dos vitoriosos, não dos vencidos. Ou que crimes foram delimitados após os fatos, rompendo uma histórica barreira doutrinária.

Ainda assim, realizou-se a justiça possível em um momento complexo, inusitado e de proporções até então desconhecidas. Com isso, fixaram-se bases para a construção da jurisdição internacional que se seguiria: Tribunal ad-hoc para a ex-Iugoslávia, para crimes em Ruanda, e, enfim, o Tribunal Penal Internacional.

E não estamos falando de crimes simples ou corriqueiros. A máquina de matar do Terceiro Reich assassinou nada menos do que seis milhões de judeus, além de homossexuais, comunistas e ciganos. A limpeza étnica de Milosevic aniquilou cerca de 200 mil bósnios e quase 700 mil tutsis foram vítimas na África.

Mas os Estados Unidos já não têm mais a pretensão de impor julgamentos a grandes criminosos. Nem sequer ratificaram o Estatuto de Roma, com receio de serem eles mesmos inseridos no banco dos réus.

Hoje, seu presidente vem a público se jactar de ter inserido o assassinato de um terrorista como uma das prioridades de sua gestão, e vangloriar-se de tê-lo conseguido.

Nada que seja, em si, uma novidade.

Desde setembro de 2001, a "guerra ao terror" anunciada por George Bush vem justificando todos os excessos norte-americanos.

Justificou a invasão ao Iraque, cujo pretexto de encontrar armas de destruição em massa se mostrou inverídico. Justificou a invasão ao Afeganistão, justamente para a procura de Bin Laden, e a ocupação do país por quase uma década. Justificou barbaridades cometidas com presos no Oriente Médio, como as fotos de Abu Ghraib expuseram ao mundo.

E vem ainda justificando centenas de presos jogados em Guantanamo, há nove anos sem qualquer acusação. Recente vazamento do Wikileaks apontou que a própria inteligência americana contabiliza mais de uma centena e meia de inocentes, vítimas colaterais do terrorismo de Estado.

Barack Obama galvanizou as esperanças de descompressão da era Bush. Na campanha, mostrou o quanto as mudanças eram viáveis e fez o mundo, mais ainda do que os americanos que lhe deram vitória estreita, acreditarem que outro governo era possível.

Pela expectativa criada, recebeu inclusive um inédito Prêmio Nobel da Paz por antecipação, para que se sentisse devedor dos valores que suas mensagens difundiam.

Mas, eleito, manteve a ocupação do Afeganistão, manteve seus homens no Iraque, manteve os presos em Guantanamo. Declarou uma guerra, sem ouvir o Congresso. E seu maior trunfo na eleição do ano que vem será nada menos do que a cabeça de Osama Bin Laden jogada ao mar, como resultado da guerra ao terror que havia reeleito Bush.

Era isso que o "Yes, we can" queria dizer?

Americanos eufóricos saíram às ruas na madrugada de segunda para comemorar a morte anunciada do terrorista, como faríamos se tivéssemos ganho uma Copa do Mundo.

Não era apenas alívio - era pura satisfação. Mas esse mórbido sentimento de regozijo dificilmente tornará os Estados Unidos um país mais seguro ou mais feliz para se viver.

A comemoração pode purgar o sofrimento de um império ofendido por um grupo de lunáticos terroristas, mas a questão é saber: o que irá ao mar junto com o corpo de Osama?

A delicada e custosa construção da justiça internacional, desnecessária diante do assassinato de Estado.

A vantagem moral que a civilização impõe à barbárie, prejudicada na absorção pelo poder do modus operandi do terror.

A evolução de séculos que enquadrou a vingança dentro dos conceitos e dos limites do direito, estabelecendo as noções de pena e processo.

Difícil crer que a morte de Bin Laden resolva os problemas do terror. Os próprios norte-americanos alertam para possíveis e iminentes represálias.

Obama está se transformando rapidamente em Bush e isso provavelmente lhe renderá uma reeleição segura.

Pode estar realizando o desejo de milhões de norte-americanos, à moda de seu antecessor: dar uma lição no terror e mostrar a todos que não há limites ao poder dos EUA.

Mas não vai conseguir que o mundo acredite que faz guerras em nome da paz e que assassina em nome da justiça.



[Autor de "Crime Impossível" (Malheiros) e do romance "Certas Canções" (7 Letras). Responsável pelo Blog Sem Juízo.



Fonte: Jornal do Terra - terramagazine.terra.com.br]

http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?boletim=1&lang=PT&cod=56131


04.05.11 - Mundo



A barbárie e a estupidez jornalística



Elaine Tavares


Jornalista


Adital




Imaginem vocês se um pequeno operativo do exército cubano entrasse em Miami e atacasse a casa onde vive Posada Carriles, o terrorista responsável pela explosão de várias bombas em hotéis cubanos e pela derrubada de um avião que matou 73 pessoas. Imagine que esse operativo assassinasse o tal terrorista em terras estadunidenses. Que lhes parece que aconteceria? O mundo inteiro se levantaria em uníssono condenado o ataque. Haveria especialistas em direito internacional alegando que um país não pode adentrar com um grupo de militares em outro país livre, que isso se configura em quebra da soberania, ou ato de guerra. Possivelmente Cuba seria retaliada e com certeza, invadida por tropas estadunidenses por ter cometido o crime de invasão. Seria um escândalo internacional e os jornalistas de todo mundo anunciariam a notícia como um crime bárbaro e sem justificativa.

Mas, como foi os Estados Unidos que entrou no Paquistão, isso parece coisa muito natural. Nenhuma palavra sobre quebra de soberania, sobre invasão ilegal, sobre o absurdo de um assassinato. Pelo que se sabe, até mesmo os mais sanguinários carrascos nazistas foram julgados. Osama não. Foi assassinato e o Prêmio Nobel da Paz inaugurou mais uma novidade: o crime de vingança agora é legal. Pressuposto perigoso demais nestes tempos em que os EUA são a polícia do mundo.

Agora imagine mais uma coisa insólita. O governo elege um inimigo número um, caça esse inimigo por uma década, faz dele a própria imagem do demônio, evitando dizer, é claro, que foi um demônio criado pelo próprio serviço secreto estadunidense. Aí, um belo dia, seus soldados aguerridos encontram esse homem, com toda a sede de vingança que lhes foi incutida. E esses soldados matam o "demônio”. Então, por respeito, eles realizam todos os preceitos da religião do "demônio”. Lavam o corpo, enrolam em um lençol branco e o jogam no mar. Ora, se era Osama o próprio mal encarnado, porque raios os soldados iriam respeitar sua religião? Que história mais sem pé e sem cabeça.

E, tendo encontrado o inimigo mais procurado, nenhuma foto do corpo? Nenhum vestígio? Ah, sim, um exame de DNA, feito pelos agentes da CIA. Bueno, acredite quem quiser.

O mais vexatório nisso tudo é ouvir os jornalistas de todo mundo repetindo a notícia sem que qualquer prova concreta seja apresentada. Acreditar na declaração de agentes da CIA é coisa muito pueril. Seria ingênuo se não se soubesse da profunda submissão e colonialismo do jornalismo mundial.

Olha, eu sei lá, mas o que vi ontem na televisão chegou às raias do absurdo. Sendo verdade ou mentira o que aconteceu, ambas as coisas são absolutamente impensáveis num mundo em que imperam o tal do "estado de direito”. Não há mais limites para o império. Definitivamente são tempos sombrios. E pelo que se vê, voltamos ao tempo do farwest, só que agora, o céu é o limite. Pelo menos para o império. Darth Vader é fichinha!





http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?boletim=1&lang=PT&cod=56123







04.05.11 - Mundo



A morte de Osama Bin Laden e o Jornal Nacional


Daniel Welton

Bancário e psicólogo cearense


Adital





Começo me apresentando: Sou brasileiro, cidadão, bancário e psicólogo da cidade de Fortaleza-CE. Não tenho costume de escrever sobre política, nem fatos públicos e pra ser honesto sobre quase coisa nenhuma mas hoje não pude me conter. Espero que possam ler até o fim...

Dia 02/05/2011, acabo de chegar em casa depois de um dia de trabalho bastante conturbado, como são os primeiros dias úteis, especialmente nas segundas-feiras no Banco do Brasil. Fiquei sabendo vagamente da morte de Osama Bin Laden a partir de rápidos comentários de clientes. Resolvi assistir ao Jornal Nacional para ver as notícias e fiquei realmente chocado com a forma que o assunto foi tratado. A morte era anunciada com um sorriso no rosto por simplesmente todos os repórteres, lembrava muito as coberturas festivas, como os carnavais, as vitórias esportistas, as festas de rua. As palavras "celebravam”, "festejavam” e "comemoravam” eram constantemente citadas e fiquei me perguntando se era realmente de uma morte que aquelas pessoas estavam falando. Em nenhum momento ninguém falava sobre como era um sintoma doentio a comemoração em praça pública de um assassinato. Ou de até que ponto aquele comportamento era ético?

Não estou aqui de maneira nenhuma defendendo as ações de Osama, muito pelo contrário, repudio seus atos, suas mortes. Mas a comemoração em praça pública de uma morte é pelo menos de se estranhar, de se questionar, e em nenhum momento houve um mínimo sinal do contraditório, do outro ponto de vista. Assistindo só conseguia me lembrar das antigas cerimônias de execução da Idade Média, ou mesmo as provocadas pelos regimes radicais como o Talibã, tão criticada pelo mundo "civilizado” ocidental, no qual o povo festejava os assassinatos, daquele que, por algum motivo, eles consideravam inferiores a si. E o que mais me impressionou é que os argumentos americanos não eram ditos como perspectivas e sim como a verdade nua e crua. Que isso acontecesse na mídia americana não era de se estranhar, mas aqui no Brasil me pareceu um contra-senso. As questões éticas da comemoração de uma morte em nenhum momento foram questionadas. Era como se fosse o óbvio, natural, a comemoração daquelas mortes.

Uma avó americana foi mostrada com sua netinha tirando fotos dizendo que era uma lembrança para aquela criança da comemoração daquele dia. A netinha devia ter pouco mais de cinco anos. E o jornal seguia mostrando tudo direitinho, a grande festa, aquele momento tão bonito de assassinato. A sede de sangue era clara. As pessoas se abraçavam, comemoravam, as imagens chegavam a ser bonitas, parecia um reveillon, ou a comemoração de um título esportivo, mas não era, era a alegria pela morte, pelo sangue, pela vingança. Espero profundamente que daqui a 100 anos isso seja mostrada como sinal de primitivismo da humanidade do nosso tempo.

As imagens do 11 de setembro, que eram repetidas o tempo todo, parecia uma maneira de justificar o assassinato de Osama e de mais quatro pessoas, sem nenhum julgamento, e pior, sem nenhum questionamento ético.

Não aguento mais ver o discurso da paz servir de propósito pra guerra. A história é contada simplesmente por uma perspectiva, a americana, oferecida ao público como uma verdade, que dispensa qualquer criticidade. O fato da operação ter sido feita exclusivamente por Americanos não é questionada. A troca de tiro não resultou em nenhum ferido do lado Ianque e cinco mortes do lado oposto leva a questionar até que ponto se tratou de uma troca de tiros ou de um simples execução sumária. E se foi uma execução sumária, como parece ter sido, o discurso de que Obama usou sua esposa como escudo mais parece uma última provocação. "O morto era covarde”. Que Osama era covarde isso é bem sabido, porém também covarde foi o ato de executar alguém sem julgamento. Não é claro e límpido que sangue só pede mais sangue. Que alguém vai querer vingar essa morte matando e que as mortes que virão pedirão mais morte ainda?

Nenhum detalhe sobre essa execução, a meu ver, pode ser levada a sério, pois não havia testemunhas, apenas os soldados americanos envolvidos. Nenhuma autoridade paquistanesa envolvida na operação, e isso sequer foi questionado. Osama foi assassinado NO PAQUISTÃO. O exército americano simplesmente entra, executa, destrói o cenário e se livra do corpo, e nada, absolutamente nada é questionado. Como se realmente o mundo fosse deles, como parecem verdadeiramente acreditar. As autoridades do Paquistão sequer tomam conhecimento do caso. E assim parece se manter toda a imprensa local, pelo mesmo caminho.

Jogaram o corpo no mar. Pronto. Como se fosse a coisa mais natural do mundo. Fizeram um exame de DNA, a partir de uma suposta irmã de Osama, de um cara que diga-se de passagem tem 51 irmãos. Qual a seriedade disso? Ninguém questiona. É como se fosse a coisa mais natural do mundo. Não é claro e límpido que existe alguma coisa estranha aí?

Para piorar, ainda vêm vários líderes mundiais a público dar os parabéns ao presidente americano. A justificativa que Obama não quis bombardear a casa a qual alegaram que se encontrava Osama por não querer ferir civis inocentes foi dita como a coisa mais normal do mundo sem mencionar o banho de sangue ao qual foi submetido o Afeganistão, como a morte de milhares de civis inocentes com a justificativa de encontrar Osama Bin Laden. É como se a guerra nunca tivesse acontecido.

Em nenhum momento um comentário crítico sobre as reais circunstâncias políticas envolvidas no caso. Nada sobre a guerra do Iraque baseada exclusivamente na alegativa americana de que estes estavam produzindo armas químicas e nucleares, coisa que o próprio relatório americano desmentiu no final, quando admitiram que se enganaram e que não havia armas químicas nenhuma. Saldo da guerra: Mais de 100 mil mortos. Em nenhum momento o petróleo foi mencionado, é como se esse produto não tivesse nenhuma relação com as milhares de mortes. Em nenhum momento foi dito do financiamento americano ao grupo de Osama Bin Laden, antes destes se voltarem contra seus interesses puramente econômicos.

Espero que não fique aqui parecendo que estou defendendo os métodos ou atitudes terroristas, mas apenas dizendo que uma guerra como essa não tem mocinhos. O ódio só gera ódio dos dois lados. E isso precisa ser dito. É preciso dizer: BASTA, CHEGA DE SANGUE! Quero poder dizer aos meus filhos que vamos celebrar a paz e o amor e não a morte e a vingança. Milhares de pessoas morreram dos dois lados, tudo isso é lamentável, e a frase que vem a minha mente quando penso nisso tudo é a da composição que diz que "Não importam os motivos da guerra, a paz ainda é mais importante que eles”.

Obrigado pra quem leu meu desabafo até o fim. Se acharem válido podem passar pra frente.

Um abraço a todos,





http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?boletim=1&lang=PT&cod=56147